No final da semana passada o país ficou a conhecer
a solução milagrosa engendrada pelo Governo para o dossiê RTP. A intenção de
fechar a RTP2 e de concessionar todos os outros canais de rádio e de televisão
a uma entidade privada, anunciada na passada quinta-feira com estrépito por
António Borges num canal da concorrência, parece constituir o plano predileto
de Relvas &. Cia para, na ótica do Governo, libertar o Orçamento Geral do Estado
dos encargos inerentes a um serviço público de rádio e televisão. Contudo, esta
proposta surge como a que melhor responde aos vários interesses em jogo. Em primeiro
lugar, os do Governo. Ao encerrar o canal que mais se aproximava de uma certa
ideia de serviço público (ver post Não
ao fim da RTP2!) mantendo no ar RTP1 onde persistem
programas do calibre de um O preço Certo em Euros, garante-se a
existência de um canal com a audiência necessária para servir de correia de
transmissão para a propaganda do Governo e de passerelle para os seus ministros.
Por outro lado, a extinção da RTP2, e não a sua privatização, como tinha sido
prometido pelo PSD, assegura aos operadores privados atualmente no terreno que
tudo se mantem como está na luta pelo mercado publicitário, sem a intromissão
de mais um jogador. Desta forma, as tomadas de posição de Balsemão e Pais do
Amaral, patrões da SIC e TVI, respetivamente, contra a privatização da RTP não
caem em saco roto. Por último, o grupo privado a quem for atribuída a concessão
dos canais de rádio e televisão vê canalizadas, diretamente para os seus bolsos,
as receitas provenientes da contribuição audiovisual paga pelos portugueses
através das faturas da eletricidade e que hoje são fatia importante do
financiamento da rádio e televisão públicas. Para além de determinar quem
acede, e em que condições, ao tal mercado audiovisual, o Governo ainda garante
uma renda fixa ao grupo empresarial que ganhar a concessão. Os consumidores de
eletricidades serão chamados a financiar uma empresa privada ao abrigo de um
contrato de concessão do serviço público quando existem outras empresas
privadas a operar em canal aberto e sem recurso a essas receitas. Tal arranjo é
a demonstração plena de como é falsa a formulação segundo a qual o capitalismo
significa livre concorrência num mercado sem regras definidas pelo Estado. Ao
optar por este expediente, o Governo regula o mercado no sentido de manter
intactas as fontes de receita dos atuais operadores privados e restringe a
entrada no mercado audiovisual a uma empresa que não fará qualquer investimento
em novas infraestruturas e que, afirmou António Borges, terá carta-branca para
despedir trabalhadores. Esta opção política mostra-nos um Governo protetor de
empresários avessos ao risco e que tudo investem em relações políticas
privilegiadas com os partidos do bloco central. Sem qualquer proteção ficam os
trabalhadores ameaçados de despedimento e os consumidores de eletricidade,
sujeitos a aumentos de monta nas faturas, e agora prováveis financiadores
involuntários de empresas privadas ociosas.
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